sábado, 30 de outubro de 2010

Ilha fantasma

As despedidas aproximavam-se e faltava ainda regressar a Bolama. Não queria deixar de lá ir, não só pelos amigos e conhecidos mas também por ser aquela ilha tão simbólica e ter sido a primeira ilha da Guiné-Bissau que visitei há cinco anos atrás quando estive pela primeira vez no país.

As vias de comunicação continuam a ser as mesmas do passado e não sofreram grandes melhorias. A canoa pública não deixou de ser a forma de transporte mais frequentemente utilizada pelos locais (e mais alguns) para se deslocarem entre Bissau e Bolama carregados de sacas de mantimentos e de tudo o mais um pouco. No entanto, para lá chegar, tal como da primeira vez, dei a volta. Aproveitando o 24 de Setembro, demorei cinco horas, passando por Buba e Fulacunda. As estradas de terra vermelha alaranjada já terão visto melhores dias e quase metade do caminho é feito em picadas. Na parte final os buracos são crateras mas ficamos grandemente a ganhar com a opção. A paisagem verde e frondosa interrompida por tabancas mais ou menos espaçadas é inspiradora. A pobreza da população é ainda mais marcante aqui. Em São João do Campo, quando a estrada acaba, há que atravessar de canoa.

Bolama é hoje um fantasma do passado. Uma ilha abandonada e onde nada parece alterar-se com o passar do tempo. A degradação das casas e das poucas estradas ou ruas existentes é enorme. A vegetação no fim da época das chuvas cresceu tanto que se torna difícil encontrar as bermas do caminho. Os carros são uma raridade e falar em água canalizada ou luz eléctrica é utopia. Não há memória de melhoramentos ou arranjos.

Ao contrário da grande parte das outras ilhas não é habitada por Bijagós, o que se explica pela sua história e grande proximidade ao continente. Em Bolama podem ser encontrados membros de quase todas as etnias da Guiné-Bissau e o seu relacionamento é pacífico, mostrando bem como os problemas do país não têm origem na diversidade.

A cidade de Bolama fica na ilha com o mesmo nome, a cerca de 40km a sul de Bissau. Em 1941 deixou de ostentar o título de capital da antiga Guiné Portuguesa e com isso foram-se também os seus anos áureos (no ano seguinte Bissau passa a ser a capital). Esta grande cidade de outros tempos foi perdendo aos poucos as suas formas e hoje o estado de degradação é avassalador. Este processo arrepiante não parece ter retorno face às dificuldades do país e à falta de apoios nesta área. Por outro lado a apatia da população mais preocupada com outros problemas, como a sua subsistência, não contribui para pintar de outra cor o quadro. A maioria não acredita que pode ser diferente. A tendência está mais perto da morte lenta do que do renascer esplendoroso.

Os imponentes edifícios da época colonial persistem em manter-se de pé, invadidos pelo tempo e pelas plantas e animais. As colunas da antiga Câmara Municipal ou Palácio do Governador em companhia de cabras e grandes mangueiras dominam a praça do império e dão um ar ainda mais majestoso ao declínio. Torna-se difícil descrever aquilo que já foi um grande centro, cheio de vida e onde os portugueses se estabeleceram. As casas de construção colonial com as suas varandas e telheiros destruídos estão ainda lá e ajudam a imaginação. A antiga escola de formação de professores do país não caminha para fim melhor. Salva-se a igreja matriz recentemente restaurada. A atmosfera do local é ao mesmo tempo, apesar da destruição e abandono, verdadeiramente inebriante e de uma beleza sinistra.

As horas de maior agitação na ilha passam pela chegada da canoa pública ao porto ou pelos jogos de futebol da equipa local, o Estrela Negra de Bolama (patrocinado pela AMI). As actividades na ilha são muito limitadas e os saltos para a água ou os jogos de bola de rua ocupam o tempo dos mais jovens. A vida económica da grande maioria das famílias depende da apanha do caju mas não chega para o ano inteiro.

Como seria de esperar a ilha encontra-se hoje praticamente desprovida de instalações turísticas. O antigo Hotel de Turismo é hoje uma miragem em ruínas. A melhor (e provavelmente única) opção de alojamento fica na ONG Prodepa (Projecto de Desenvolvimento de Pesca Artesanal) junto ao porto, onde se conseguem arranjar quartos simples mas bastante agradáveis e acessíveis.

A praia de mais fácil acesso e a cerca de uma hora de caminho a pé do centro da cidade é a praia de Ofir. As ruínas do tempo colonial ornamentam o quadro e são acompanhadas de mangais, grandes palmeiras e vacas a pastar. Os pedaços da antiga escadaria que nos conduz até à areia convidam-nos a descer e a desfrutar de longos banhos nas águas calmas e escuras do mar de Bolama e do magnífico cenário do local.

Os olhos grandes e castanhos estavam lá também e receberam-me da melhor maneira tal como o grupo inteiro. Obrigado. As caixas com roupas e comida não deixaram de fazer sucesso.

Assim se aproveitou da melhor maneira os últimos dias.

http://www.lonelyplanet.com/guinea-bissau/sights/beach/ilha-de-bolama

http://ec.europa.eu/delegations/delgnb/guia/1.htm

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Cartão Amarelo

A RDP-Africa noticiou que a Ministra do Interior da Guiné-Bissau, Adja Sato Camara, está suspensa das suas funções por ter alegadamente desobedecido às ordens do Primeiro-ministro, Carlos Gomes Júnior.

Segundo um despacho com data de 26 de Outubro, assinado pelo Primeiro-ministro, a Ministra do Interior é substituída interinamente no cargo por Luís Oliveira Sanca, actual Ministro da Administração Territorial.

O despacho acusa a Ministra do Interior (próxima do Presidente, Malam Bacai Sanha) de desafiar a autoridade do Primeiro-ministro, ostensivamente, atitude imperdoável e que não se coaduna com as responsabilidades de um membro do Governo.

O despacho de Carlos Gomes Júnior determina ainda que “estão suspensas todas as promoções tanto no seio das forças armadas como no âmbito do Ministério do Interior, ide forma a não perturbar ou prejudicar o processo de reforma em curso no sector de defesa e segurança”.

Remodelação governamental?

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Dia de consulta

Segundo a imprensa, "o Presidente guineense, Malam Bacai Sanhá, foi hospitalizado este Sábado, 23 de Outubro em Dakar, capital do Senegal, devido a um «mal-estar».

Malam Bacai Sanhá despediu-se discretamente este Sábado da sua equipa no aeroporto de Bissau quando partia subitamente para Dakar a fim de efectuar exames médicos. Fontes próximas da presidência indicaram que o presidente foi vítima de um «pequeno incidente cardiovascular», apresentado como um «mal-estar»."

http://www.luandadigital.com/noticias.php?idnoticia=7744

domingo, 24 de outubro de 2010

Época de saldos

O Governo da Guiné-Bissau, através da Direção Geral das Alfândegas, colocou à venda o avião apreendido em Julho de 2008 no aeroporto Osvaldo Vieira, em Bissau, por alegado envolvimento no narcotráfico.

A venda vem publicada num anúncio no jornal No Pintcha referindo que o aparelho, um jacto Gulfstream IIB, está à ser posto à venda na «sequência de infração aduaneira de contrabando de produtos farmacêuticos cometidos pelo comandante da aeronave N351 SE, esta última declarada perdida a favor do Estado da Guiné-Bissau por ter sido utilizada como instrumento para a comissão da infração em referência».

No anúncio, a Direcção Geral das Alfândegas da Guiné-Bissau comunica que a aeronave será vendida no estado em que se encontra, no local onde está estacionada e com a matrícula com que se encontra.

http://www.ionline.pt/conteudo/84796-guine-bissau-aviao-apreendido-alegado-trafico-droga-posto--venda

Capacete de ferro

O Governo da Guiné-Bissau propôs ao Presidente da República do país, Malam Bacai Sanhá, a nomeação do Coronel Augusto Mário Có para o cargo de Chefe do Estado-Maior do Exército, refere um comunicado divulgado no dia 22 de Outubro.

O Coronel Augusto Mário Có notabilizou-se durante o conflito de 1998/99 no país, tendo a então rádio da junta militar, hoje rádio Bombolom, ajudado a popularizar a sua alcunha de "Capacete de Ferro".

O coronel Augusto Mário Có ocupava até agora o cargo de vice-chefe do Estado-Maior do Exército.

http://dn.sapo.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=1693697&seccao=CPLP

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Os desafios da ciência regional

1.º Congresso de Ciência e Desenvolvimento Regional na Guiné-Bissau

Gabu – 24 a 30 de Janeiro de 2011

"A organização do Congresso (...) tem como objectivo o lançamento da Ciência Regional no país, na Região Africana onde se situa e em África, e tem como pressupostos interligados:
a)que o saber, o conhecimento e a informação são essenciais ao desenvolvimento sustentável das pessoas e dos sítios;
b)que o saber, o conhecimento e a informação devem ser criados localmente e integrados globalmente;
c)e que a ciência regional permite – completando e complementando outras abordagens - integrar e dar escala aos vários saberes disciplinares e plurais da Guiné-Bissau tornando-os mais efectivos em termos do desenvolvimento sustentável das pessoas e dos sítios do país.

A escolha de Gabu como local do Encontro tem fundamento. De facto a região administrativa de Gabu integra o lugar simbólico de Madina de Boé, berço da fundação da Guiné-Bissau. Por outro lado, Gabu encontra-se perto de um dos centros de distribuição mais importantes de África, na separação das bacias ambientais e civilizacionais dos rios Geba, Gâmbia, Senegal e Níger. Finalmente, porque a partir das pessoas aí enraizadas se estabeleceram relações com Universidades e Centros de Investigações Científicas da Gâmbia, do Senegal, da Guiné-Conacri, do Mali, do Níger, da Algéria, de Angola e Moçambique e, naturalmente, de Cabo Verde."

Datas importantes:
30 de Outubro de 2010 - recepção de resumos
2 de Novembro de 2010 - aceitação dos resumos
15 de Dezembro de 2010 - recepção final das comunicações

Presidente da Comissão de Organização
Augusto Idrissa Embalo
Email: idrissaembalo@hotmail.com
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa - INEP

Secretariado
Elisabete Martins
Email: apdr@apdr.pt; elisabete.martins@apdr.pt
Associação Portuguesa para o Desenvolvimento Regional - APDR
Universidade dos Açores - DCA

Mais informações em: http://www.apdr.pt/encontros/guine/index.html

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Pirâmide artificial

As notícias que circulavam há já algumas semanas foram finalmente confirmadas na 5ª feira passada, dia 7 de Outubro, com a nomeação do Contra-Almirante Bubo Na Tchuto para a chefia da Marinha da Guiné-Bissau. De lembrar que no dia 1 de Abril deste ano, Bubo Na Tchuto e o General António Indjai não só destituíram o Almirante Zamora Induta da chefia do Estado-Maior General das Forças Armadas, como chegaram a prender, durante algumas horas, o Primeiro-ministro, Carlos Gomes Júnior. Num momento em que as relações da Guiné-Bissau com (parte d)a comunidade internacional se encontra muito fragilizada, o anúncio da escolha para o cargo de um dos principais suspeitos de envolvimento no narcotráfico da região nada vem ajudar ao desenvolvimento dos acontecimentos. Continuam em Bissau as nomeações políticas livres de qualquer pressão militar…

Deixo parte relevante de artigo recente do jornal Público sobre o assunto.

“O Presidente, Malam Bacai Sanhá nomeou o contra-almirante, Bubo Na Tchuto, Chefe do Estado-Maior da Armada da Guiné-Bissau, mas a representante da União Europeia (UE) para os Negócios Estrangeiros e Política de Segurança, Catherine Ashton, lamentou-o profundamente.

Bacai Sanhá explicou ter recolocado Bubo Na Tchuto no lugar que já em tempos desempenhara por entender que isso poderá contribuir para a estabilidade de um país muito agitado. Mas a UE, por seu turno, destacou o “papel desestabilizador” de Bubo nos acontecimentos de 1 de Abril último, quando o general António Indjai o foi buscar às instalações das Nações Unidas onde se encontrava refugiado e juntos prenderam o então chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas, Zamora Induta.

“É uma tentativa do poder legítimo da Guiné-Bissau, do Governo e da Presidência da República, de criar um clima propício para a implementação da reforma do sector de defesa e segurança”, afirmou Malam Bacai Sanhá aos jornalistas, enquanto Catherine Ashton recordava que o oficial em causa se encontra sujeito a sanções por parte de entidades internacionais, designadamente norte-americanas, por se ter considerado que estava envolvido no narcotráfico que dilacera a vida da África Ocidental.

“A comunidade internacional vai compreender a nossa posição, como compreenderam sempre. Vai compreender a necessidade que nós temos de estabilizar este país e nós estaremos à altura de dar essas explicações”, disse o Presidente guineense, depois de haver recolocado Bubo no lugar que tivera até Agosto de 2008, quando foi acusado de actividades golpistas pelo então chefe do Estado-Maior General, general Tagme Na Waie, que viria a ser assassinado em 1 de Março do ano passado.

(…)

De acordo com as palavras da britânica Catherine Ashton, a recolocação de Bubo Na Tchuto à frente da Armada confirma, se necessário fosse, a militarização da política naquela antiga colónia portuguesa, onde nos últimos sete meses Presidente e Governo têm feito quase tudo o que é desejado por alguns oficiais generais.

Em Junho, o Tribunal Militar guineense arquivou as acusações de alegada tentativa de golpe de Estado que haviam sido formuladas contra Bubo Na Tchuto; e, a partir daí, ele começou a exigir que o colocassem de novo no Estado-Maior da Armada. Isto apesar de o departamento norte-americano do Tesouro o ter colocado na lista internacional de narcotraficantes."

(…)

http://www.publico.pt/Mundo/almirante-que-washington-considera-narcotraficante-foi-colocado-a-frente-da-armada-da-guinebissau_1460395