Ao longo das últimas semanas têm sido publicados alguns artigos criticando a actuação da comunidade internacional face ao golpe militar de dia 1 de Abril e à crise por este gerada. Essencialmente estes (poucos) artigos menos abonatórios, sejam de analistas, jornalistas, simples curiosos ou outros, têm colocado em causa o papel das organizações internacionais, particularmente da União Europeia, pela sua manifestação de forte oposição contra os envolvidos no referido golpe e pelo facto de abertamente ser criticada a inércia demonstrada pelas autoridades da Guiné-Bissau na resolução do impasse.
A comparação que alguns procuram fazer entre os eventos de 1 de Abril e outros tristes acontecimentos ocorridos nos últimos meses e anos, como os assassinatos do Presidente Nino Vieira ou do General Tagme, e mais tarde dos ex-ministros Baciro Dabó e Helder Proença, tem, porém, de ser energicamente combatida. Não se pode levianamente acusar a comunidade internacional de ter duas posições consoante os seus interesses e as suas vontades. Estaríamos a ser injustos. De facto o que está em causa não é saber se estes acontecimentos são ou não mais graves do que os ocorridos no passado mas antes reconhecer que os eventos mais recentes foram desencadeados pelas altas chefias militares aos olhos de todos e sem reserva de identidade. Sem margem para dúvida que as mortes do passado são uma tragédia e todos estamos de acordo que a solução dos problemas do país não pode passar por actos como estes, no entanto, quando as próprias instituições nacionais à luz do dia são intervenientes num golpe, não resta à comunidade internacional outra saída que não seja a de condenar duramente os actos ocorridos no dia 1 de Abril.
O que torna estes acontecimentos de Abril (e cujas consequências infelizmente se perpetuam até hoje) diferentes de outros passados no país, é o facto de à vista de todos, com direito a transmissão via rádio e televisão, se conseguir claramente identificar aqueles que atentaram contra o estado de direito. Não há espaço para contradição. Os próprios envolvidos o admitem e até conseguem encontrar razões para os seus actos. Por vezes, a imaginação parece mesmo não ter limites... Neste caso (ao contrário de outros que aguardam há largos meses pelas conclusões das comissões entretanto criadas), conhecemos claramente quem são os responsáveis. Sabemos quem deu ordens, quem mandou prender o Chefe de Estado-maior das Forças Armadas, quem mandou prender o Primeiro-ministro ou quem ameaçou matar a população…
A comunidade internacional não pode ser acusada de ingerência nos assuntos internos do país quando actua e por outro lado ser acusada de nada fazer e pactuar com as ilegalidades quando aguarda que as autoridades nacionais tomem as medidas necessárias para fazer face ao desrespeito pela lei.
Fará, por outro lado, sentido justificar actos do presente com posições do passado? O facto de se ter actuado de determinada forma num dado momento, significa que se fique eternamente agarrado a essa posição? Se em determinadas situações a comunidade internacional foi acusada de ser demasiadamente permissiva e de certa forma pactuar com comportamentos censuráveis, deve agora ser obrigada a manter essa neutralidade e tudo aceitar? Repito: não entendo que a comunidade internacional tenha anteriormente actuado mal ou tenha sido excessivamente tolerante, apenas considero que o argumento utilizado é fraco e facilmente combatido. As circunstâncias hoje em dia são bem diferentes e obrigam a outro tipo de postura.
Não estará na mão daquele que financia, que envia os apoios humanos e materiais, que decide pela permanência de uma Missão ou projecto, tomar as suas decisões livremente? As circunstâncias, quando a UE aceitou participar no processo de reforma, eram diferentes, será que não existe o direito de estar ou não interessado em continuar a trabalhar com as autoridades nacionais? Se sou convidado para participar num torneio de futebol e mais tarde chego ao terreno de jogo e a organização me diz que afinal se vai jogar basquetebol, será que não está no meu direito decidir se continuo a participar ou não? Se estou a contar ter como interlocutores determinadas pessoas e de repente me vejo perante a situação de ser obrigado a dialogar com outras que não me dão a mesma confiança, sou obrigado a continuar?
A UE, ao contrário do que alguns quiseram fazer passar, não fez exigências para continuar os seus esforços na reforma do sector de defesa e segurança. O que fez sim, foi apresentar as condições que teriam de ser respeitadas para que no futuro continuasse as suas actividades nesta àrea, nomeadamente para que a Missão de implementação da Reforma tivesse início. Cabe ao Governo e às autoridades da Guiné-Bissau decidir o que pretendem para o seu futuro. Infelizmente, neste momento, parece que não estão criadas no país as condições para que essa decisão seja tomada em liberdade e segurança.
Irá o golpe militar de dia 1 de Abril alcançar os seus objectivos?
domingo, 6 de junho de 2010
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