Recentemente a Guiné-Bissau voltou a estar em destaque nos meios de comunicação social e infelizmente uma vez mais não pelos melhores motivos. Mais uma tentativa de golpe de Estado teve lugar no dia de 1 de Abril. Desta vez o sucesso não foi total. Embora a ordem constitucional tenha sido interrompida os intentos últimos da operação não foram atingidos. As alterações deram-se ao nível das Forças Armadas onde um golpe militar deixou bem claro quem tinha mais força junto das tropas e dos seus homens.
Não parecem ter ficado muitas dúvidas de que a subordinação dos militares ao poder político é algo do papel e se encontra muito longe da realidade. Como é possível um Primeiro-Ministro ser afastado das suas funções (mesmo que por apenas algumas horas) e ser ameaçado de morte pelo próprio Vice-Chefe do Estado-Maior, General António Injai? Ou como é possível um Chefe de Estado-Maior General, nomeado apesar de tudo de acordo com a Constituição, ser detido e continuar detido pelos próprios militares? Acresce a isto o facto de não se vislumbrar por parte das autoridades civis qualquer intervenção no sentido de condenar os perpetuadores deste golpe. Lembro ainda que as ameaças do Vice-Chefe do Estado-Maior foram transmitidas pela rádio e estão ainda bem presentes nas conversas diárias entre os guineenses.
Será suficiente um simples pedido de desculpas? Aparentemente sim e insólito também. O líder da revolta militar falou à comunicação social para pedir desculpas ao povo guineense pelas declarações proferidas em que ameaçava matar o chefe do governo se a população continuasse a manifestar-se em gesto de solidariedade para com este, pelas ruas de Bissau… "Peço a Sociedade Civil e à população guineense em geral as minhas desculpas, por ter proferido aquelas palavras de desgraça"… serão necessários muitos comentários? Aqueles que se manifestaram e defenderam o Primeiro-ministro junto de sua casa merecem sem dúvida um destaque posterior.
Entretanto, após mais de 10 dias passados, continuam detidos o Chefe de Estado Maior General, Almirante Zamora Induta e o responsável dos serviços de informação militar, o Coronel Samba Djaló. Os dois encontram-se de momento detidos nas instalações militares de Mansoa. Segundo o presidente do Observatório dos Direitos Humanos, Democracia e Cidadania do país, ambos estão debilitados e a necessitar de tratamento médico. As péssimas condições em que se encontram presos é também referida. A mesma fonte informou ainda os dois ainda não foram oficialmente acusados e que não foram apresentados às autoridades judiciais.
Até ao momento as razões apresentadas pelos autores do golpe militar são as enumeradas no comunicado do Estado Maior (são dois mas o segundo repete parte do primeiro…). A sua leitura é indispensável... Ficamos a saber que o Chefe de Estado Maior frustrou “(frustrado) as expectativas pelas quais havia sido unanimemente nomeado pelas chefias militares”. Qual o papel do Primeiro-ministro e do Presidente da República na nomeação de um Chefe de Estado Maior? Na Guiné-Bissau são os militares que nomeiam o seu chefe? Uma leitura da Constituição e das leis parece urgente. Leitura e aplicação.
O documento enumera ainda vários exemplos de supostas intervenções indevidas das Forças Armadas em assuntos que não eram da sua competência e que foram promovidos pelo Almirante Zamora Induta, para justificar a sua prisão e em última instância o golpe. Bem como acusam o Chefe de Estado Maior de possuir armamento em casa e pretender criar um “exército privado, representando este um perigo, com consequências imprevisíveis"…
Apesar de tudo o que se passou, as autoridades políticas nacionais parece não terem força suficiente para condenar o golpe militar. As declarações proferidas são disso exemplo. As reuniões entre as partes envolvidas sucedem-se mas nada é resolvido. O clima é de insegurança e de instabilidade. Como se pode garantir que os problemas estão ultrapassados?
Por uma vez a Comunidade Internacional pareceu falar em conjunto e condenou fortemente os acontecimentos de dia 1 de Abril. As declarações de alguns membros de governo, Embaixadores ou representantes de Organizações internacionais, foram todas direccionadas no mesmo sentido e exigiram a tomada de medidas perante o sucedido. Foram também claros em criticar a prontidão das autoridades nacionais quando estas afirmaram que a situação já estava superada e de que se tratou apenas de um pequeno problema entre militares. Alguns declararam ser impossível trabalhar com o actual Vice-Chefe de Estado Maior ou com o Contra-Almirante Bubo Na Tchuto, também implicado no golpe militar.
Será que podemos concordar com aqueles que dizem que a situação está normalizada apenas porque os militares voltaram às casernas? Caso os autores do último golpe que teve lugar em Bissau não sofram as consequências do atentado que fizeram à democracia e, pelo contrário, forem confirmados nos cargos que ilegitimamente tomaram, talvez a solução, como aponta o General Loureiro dos Santos e outros, deva passar pelo congelamento à Guiné-Bissau de todos os apoios em curso e prometidos das organizações internacionais.
Como podem as Nações Unidas, a União Europeia e outras Organizações Internacionais, ou as diversas cooperações bilaterais, continuar o seu trabalho conjunto com as autoridades militares? Devem estas passar a trabalhar com quem acaba de dar um golpe e fingir, como outros, que nada de grave se passou?
Muitas perguntas continuam ainda sem resposta. Mas é urgente que a situação seja clarificada. Quem será o próximo Chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas? Nomeado por quem? Qual o destino do Vice-Chefe de Estado Maior? Mantém o seu lugar? O que sucederá ao Ex-Chefe de Estado da Armada, o contra Almirante Bubo Na Tchuto, que ainda a semana passada foi acusado pelos Estados Unidos de estar implicado no tráfico de droga? Qual a relação do golpe com o futuro da Reforma do Sector de Defesa e Segurança? E muitas outras questões poderiam ainda ser levantadas. No entanto, as soluções não podem ser encontrada no habitual ritmo bissau-guineense. Desta vez os problemas não se podem resolver com o tempo. Há que tomar medidas por mais impopulares que estas sejam. Por vezes sabemos que há crime mas não sabemos quem o cometeu, e noutras ocasiões conhecemos os dois lados.
segunda-feira, 12 de abril de 2010
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