sexta-feira, 9 de julho de 2010

Soberania do poder das armas

O que está em causa na nomeação do novo Chefe de Estado Maior General das Forças Armadas não é a questão de saber se esse acto é soberano ou não, mas antes discutir as razões que levaram à necessidade dessa mesma nomeação. De facto não parece haver quem não reconheça soberania na escolha efectuada ou mesmo quem aponte falhas jurídicas na forma como o acto foi conduzido. As autoridades da Guiné-Bissau afirmam em uníssono que a Constituição da República foi respeitada, tendo a nomeação seguido os passos legais obrigatórios. Ou seja, as Forças Armadas indicaram ao Governo os nomes daqueles que entendiam ser as pessoas adequadas a ocupar o posto e o Presidente confirmou o nome indicado pelo Primeiro-ministro. No entanto e apesar do respeito (excepção à regra) da legalidade neste caso, devemos esquecer o que se passou no dia 1 de Abril? Onde está o processo contra os implicados no golpe militar? Qual o motivo pelo qual o Procurador-geral da República não avança com uma investigação? Ninguém vai ser acusado? A Guiné-Bissau é um país onde se pode prender o Primeiro-ministro, ameaçar de morte a população e sair impune?

Muitos militares em conversas informais são peremptórios em afirmar que não estão com o seu novo Chefe. No entanto também dizem claramente que neste momento não há ninguém que lhe possa fazer frente e que consiga unir os descontentes contra ele. Aliás referem ainda que dificilmente algum oficial superior aceitaria assumir o cargo sabendo que o Gen. Indjai continuaria activo e com a força das armas do seu lado.

A opção de nomear como Chefe de Estado Maior General das Forças Armadas, o principal líder do golpe militar de Abril passado, prova bem como as autoridades civis se encontram refém do poder das armas. A escolha, por mais que seja defendida como sendo soberana, não é feita em liberdade e como tal deve ser criticada.

Quando o Presidente da República, Malan Bacai Sanha, afirma que “uma coisa é querer, outra coisa é poder” temos de nos questionar sobre o sentido destas palavras. Ou quando o Primeiro-ministro, Carlos Gomes Junior, reage às criticas da comunidade internacional sobre a nomeação do novo CEMGFA dizendo: “não é uma situação que nós todos desejamos mas são situações que temos de saber gerir, para conseguirmos garantir a paz e estabilidade.” O que devemos pensar? Uma decisão tomada em consciência? Um Primeiro-ministro que propõem para a Chefia das Forças Armadas o homem que o mandou deter? Será que restam dúvidas que a decisão tomada demonstra a submissão do poder civil ao poder militar?

A própria CEDEAO (e portanto não a União Europeia, mas antes os países vizinhos africanos) afirma que a nomeação foi uma imposição contra a vontade do poder político.

Curiosamente o Presidente disse também, recentemente, que a Guiné-Bissau está cansada das críticas e dos puxões de orelhas. O que dirá a Comunidade Internacional face aos acontecimentos à margem da lei que se repetem regularmente? Que está ultra-cansada? Exausta?

Como pode o Chefe de Estado falar em trabalhar para a paz verdadeira e desenvolvimento com as actuais chefias militares no poder?

1 comentário:

HUMANITARIUS disse...

Sintetizando..., nunca vi uma visão tão correcta e tão bem estruturada, sobre o que se passa na politica da Guiné. Perfeito.
Bem haja

J. Almeida